O que se segue constitui uma proposta de acção a ser tomada por quem se encontra nesta situação.
Na
minha opinião, quando mais de um milhão de pessoas é desempregado
oficial, é desempregado não oficial porque desistiu de o ser, é precário
ou inclusivamente trabalha mas é muito pobre, existe massa crítica para
passar do plano das reivindicações para algo mais ofensivo. Quero com
isto dizer, que em vez de reivindicar, devemos dizer, ou antes, devemos
informar o que vamos fazer. Definido o que vamos fazer, o como o vamos
executar dependerá do posicionamento que os restantes movimentos,
partidos, sindicatos e governo tomarem.
O País tem
vários problemas: desemprego, uma desigual repartição da riqueza, défice
de produção de bens transaccionáveis, défice da balança de pagamentos,
consequentes dívidas pública e privada, Segurança Social a definhar, SNS
idem, défice no Estado, défice na larga maioria das famílias.
O que fazer então?
A
minha proposta é simples. Trata-se de ir buscar o dinheiro onde ele
está: tributar progressivamente ou aumentar progressivamente tributos referentes a mais valias bolsistas,
movimentos de capital, lucros, propriedade de artigos de luxo, SGPSs,
grandes empresas privadas, propriedade imobiliária que somada por agregado
familiar esteja, por exemplo, acima de 150 mil euros. O argumento é o mesmo que está a
ser usado para tantas outras coisas:
encontramo-nos num momento de
emergência nacional. O dinheiro arrecadado deverá ser usado em
actividades produtivas (de bens transaccionáveis) no campo industrial, agrícola, pescas ou minas,
para dessa forma se substituir importações e eventualmente aumentar as
exportações. O dinheiro deve ser usado de forma a que não seja
necessário mais investimento de capital para assim não existir
necessidade de pagar qualquer rentabilidade do capital investido (pois
o investimento terá sido a fundo perdido), nem qualquer necessidade de contratação de
empréstimos à banca, para que desta forma se consiga competir pelo preço. Os
produtos serão mais baratos, precisamente porque a parte relativa ao
capital se restringe a impostos e serviços necessários para o
funcionamento da empresa. O preço será mais baixo, não pela mão de obra
mais barata mas porque o custo do capital é muito mais baixo.
Desta
forma, mais de um milhão de pessoas, justamente pagas, começa a trabalhar em actividades
produtivas rentáveis sem que isso tenha implicado qualquer aumento do défice do Estado,
diminui-se as importações porque estas serão satisfeitas pela produção
interna, o Estado social torna-se sustentável porque os desempregados
deixam de ser um peso e pelo contrário passam a ser uma fonte de
receitas do Estado. Resolve-se assim todos os grandes problemas do País,
mas principalmente, acaba-se com a chaga do desemprego.
Na
realidade, há numa coisa em que estou de acordo com PPC: não devemos ser piegas... Assim,
em vez de reivindicar o que está mal, devemos informar que, enquanto
pessoas desempregadas, recusamos ficar na berma da estrada, na valeta, à espera da
morte e em vez disso vamos alterar a realidade em que vivemos
contribuindo dessa forma para a resolução dos problemas do País.
Como o fazer?
Apelando
à organização, reunindo electronicamente contactos, pois isso está nas
mãos dos desempregados e ninguém o pode impedir. Dessa forma, quando
necessário, rapidamente se pode mobilizar uma multidão, obtendo assim
peso político, condicionando e direccionando o debate público nas
questões que são as nossas, frisando sempre que quando o nosso problema
estiver resolvido, todos os outros também o estarão. Se há algo que
temos é tempo e possivelmente só necessitaremos coordenar as nossas
disponibilidades. Tenhamos em conta que todas as acções ou manifestações
de desempregados provocará sempre o respeito (para não dizer o medo) de
toda a sociedade.
Há
dias uma amiga recordou-me uma coisa que eu não tinha tomado
consciência: vivi 7 anos na América Latina, e acompanhei com especial
interesse o que aconteceu na Argentina antes, durante e depois do
default. Lá quem resolveu o problema foram precisamente os desempregados (
los piqueteros, usar o
google para saber a história). Ora, em Portugal estamos numa situação em tudo semelhante.
Recordando os últimos 30 anos portugueses, em que:
- o Estado se retirou primeiro dos sectores produtivos,
- o Estado progressivamente está a sair das escolas e universidades, sector da saúde e sistemas de pensões,
- o Estado, vende monopólios naturais a outros estados,
- gradualmente as grandes fortunas têm vindo a pagar cada vez menos impostos, e possibilitado que fujam para offshores para evitar serem taxadas, com a desculpa de que assim teriam mais dinheiro para criar emprego,
verifica-se que os privados não ocupam o lugar deixado vago no
sector produtivo e se limitam a importar o que outros fazem. Não sei se
tal se deverá ao facto de não saberem, não querem ou não terem
possibilidade de entrar no sector produtivo. Mas a resposta é
irrelevante e é para mim incompreensível que não esteja em cima da mesa
ser o Estado a reocupar o lugar que ninguém ocupou nem ocupa. É
necessário investimento na produção de bens transaccionáveis e Portugal
não detém o controlo da moeda... mas
mantém o controlo da fiscalidade. Mesmo que as regras europeias não
possibilitem a entrada do Estado em sectores produtivos, o Estado poderá
manter-se
nessa posição e simplesmente abrir concursos dedicados exclusivamente a
desempregados para que sejam estes a formar empresas geridas pelos
próprios em
que o produto do trabalho terá a garantia de ser comprado em última
instância pelo Estado, de forma análoga às PPPs que têm o lucro
garantido, com a diferença em que por um lado, o Estado obterá em troca
os produtos, que serão um activo, e por outro, e ao contrário das PPPs,
não se estará a garantir lucros de uma minoria. Da mesma forma que se
mantém bancos falidos, porque não manter ou arrancar com empresas
produtivas que
garantem a independência nacional e principalmente a vida dos seus
cidadãos? Isto pode parecer uma heresia, mas ter-se-á uma certeza: uma
empresa gerida pelos próprios trabalhadores não será deslocalizada
porque os trabalhadores não quererão ficar
sem o seu posto de trabalho e também não permitirão que uma minoria
deles ganhe muito mais do que os restantes, trazendo assim a democracia
para o local de trabalho. É só poupança, porque todos querem manter a
empresa a funcionar.
Claro que para minimizar os cortes
ao capital, poder-se-á usar o que ainda não foi gasto no QREN (13 mil milhões de euros) e os 12
mil milhões reservados para os bancos. De qualquer forma, é bom recordar
que o capital é o que sobra depois de quem o poupa ter garantido a sua
subsistência, enquanto o salário dos trabalhadores é aquilo que se paga
para que estes continuem nessa condição.
Trata-se simplesmente de transformar os desempregados na solução dos problemas do país.
Esta
ideia poderá talvez parecer radical, mas do ponto de vista de um
desempregado, radical é não ter como subsistir, é não conseguir cumprir
com as suas obrigações familiares, é não conseguir pagar a habitação, é
não conseguir alimentar os seus filhos.