Escrevi este post ontem, a propósito das declarações de Edmundo Martinho, presidente do Instituto da Segurança Social, que veio defender a redução progressiva do subsídio como forma de incentivar as pessoas a encontrarem emprego. Depois escrevê-lo, fiquei a saber do pedido de “ajuda” externa e questionei-me se estaria desactualizado... Acabei por concluir que o tema não pode estar mais actual – bem sabemos que a “ajuda”, é a ajuda que os de cima precisam para impôr mais austeridade. Neste sentido, é impressionante como uma proposta deste género parte de alguém que, pelas suas responsabilidades específicas, deveria estar particularmente sensível à situação de quem está desempregado. Um sinal de que a ideologia da austeridade está tão generalizada que um dirigente que deveria bater-se pela defesa dos valores do organismo a que preside acaba por defender o desrespeito dos direitos e dos interesses de quem contribui para, ou beneficia, da segurança social: contribuintes que hoje têm trabalho mas que amanhã poderão ficar desempregados/as; beneficiários/as que ontem contribuíram e que hoje estão desempregados/as.
Os argumentos de Edmundo Martinho não deixam de ser curiosos: uma redução gradual evitaria reduzir a capacidade de protecção nos primeiros tempos, que são mais complicados; o subsídio de desemprego não deve constituir um entrave para que o/a desempregado/a regresse ao mercado de trabalho. A proposta é desfasada quanto à realidade da experiência do desemprego. Serão os primeiros tempos de desemprego os mais complicados? Até poderão ser, em termos de adaptação pessoal à nova realidade – e agora, o que vai ser da minha vida?, é a questão que se nos coloca –, mas o impacto maior, do ponto de vista financeiro não virá no início. E, à medida que o tempo vai passando, o impacto da redução de rendimentos acaba por ser cada vez mais gravoso, porque tem um efeito cumulativo e as perspectivas de melhoria são reduzidas. Com o tempo, até se poderá verificar algum reajustamento financeiro, mas à custa de muitas privações e da diminuição de qualidade de vida.
E como se explica que mais de metade de desempregados que não tem subsídio de desemprego? Se ter subsídio de desemprego fosse um obstáculo a encontrar emprego, esses/as desempregados/as nem sequer existiam... Toda a argumentação é, de resto completamente enganosa. Edmundo Martinho diz que o subsídio de desemprego não deve servir de entrave a voltar ao mercado de trabalho, mas considera que “o importante é que quem fica desempregado tenha a garantia de que não fica sem rendimento mas, ao mesmo tempo, que se sinta responsabilizado a procurar uma solução para a sua vida”. Pois, na verdade nem o próprio deve acreditar que diminuir o subsídio de desemprego vá diminuir o desemprego. Basta olhar a evolução das estatíticas de desemprego antes e após da entrada do novo regime do subsídio de desemprego: entre 2006 [ano da entrada em vigor do novo regime de subsídio de desemprego] e 2011, a taxa desemprego subiu, baixou, e voltou a subir, mas esta variação não acompanhou a variação das condições de acesso a protecção social. Mesmo quando foi reduzido e dificultado o acesso ao subsídio de desemprego, como aconteceu no ano passado, não se verificou uma diminuição da taxa de desemprego - pelo contrário subiu -, apenas um aumento do nº de pessoas sem direito a qualquer protecção social.
Na verdade, a proposta de Edmundo Martinho não só não resolve qualquer proplema como agrava-o: é que, não sendo realista pretender reduzir o desemprego sem criar emprego, reduzir as condições de protecção social dos/as desempregados/as não só vem agravar a sua situação de vulnerabilidade social, como os/as pressiona para aceitar qualquer trabalho, precário e sem direitos, constituindo assim elemento de desregulamentação do mercado de trabalho. Enfim, só não entende quem não quer entender: não há combate ao desemprego sem promover criação de emprego e esse objectivo não é alcançável no quadro austeritário que anda tanto em voga. Mais do que nunca, em tempo de “ajuda” externa e mais pressão para os cortes anti-sociais, vale a pensa perguntar: e a criação de emprego, pá?
Lídia Fernandes,
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