quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Crónica de uma ida ao Centro de Emprego


Hoje estive no Centro de Emprego da minha zona de residência. Tinha sido notificado, e se não aparecesse na hora marcada, perderia o Subsídio de Desemprego que tanto me custou pagar durante os anos em que trabalhei. Tratou-se de uma palestra em que a diligente funcionária recordou que para continuar a receber o Subsídio de Desemprego, para continuar a receber o Subsídio de Reinserção ou no caso de não receber nenhum destes, o cidadão para continuar a contar para a estatística dos desempregados teria que aparecer sempre que para isso fosse notificado.

Para um crente no sacrossanto Mercado, esta lógica de mark to market faz todo o sentido, pois quem gere o sistema pretende demonstrar sem sombra de dúvidas que está a fazer um bom trabalho e para isso define a métrica que mais lhe convém, independentemente da realidade. Como aqueles que gerem o sistema são pessoas acima de qualquer suspeita e não uns sociopatas, como muitos dizem, e assim querem de facto melhorar a vida dos seus concidadãos, assumirão que o sacrossanto Mercado tem obviamente a capacidade de ver para além das inconsistências entre a realidade e os números publicitados e por isso providenciará os meios necessários à população e terão certamente razão pois afinal essas pessoas que ficam de fora das estatísticas ainda não morreram. Bem aventurado seja o sacrossanto Mercado.

Seguidamente, a diligente funcionária do Centro de Emprego informou que felizmente o sistema agora era muito mais ágil e por isso, todas as ofertas de trabalho que apareciam eram imediatamente preenchidas, de tal forma que se abria uma oferta em duas horas esta fechava porque apareciam logo dez candidaturas. Santificado seja o Mercado!

A palestra demorou uns 10 majestosos minutos. Nem podia ser de outra forma, aleluia sacrossanto Mercado!

Já estava na rua quando me apercebi que não tinha como comprovar a minha presença no Centro de Emprego, e por isso, se alguém se enganasse no processamento da informação no Centro de Emprego, poderia perdê-lo. Voltei e pedi um comprovativo da minha presença. Para conseguir o documento tive que falar com seis pessoas, que me perguntaram para que queria eu o documento ao que eu sempre expliquei que não tinha forma de comprovar que tinha correspondido à notificação. Responderam que isso ia ser registado no sistema e que não tinha que me preocupar com isso. Insisti e explicando que não estava a duvidar do trabalho daqueles com quem estava a falar mas que entendessem que tinha filhos e responsabilidades. Lá me deram o documento (propositadamente desfocado).

O que me parece insólito é que mais ninguém (eram umas vinte pessoas) tenha pedido o comprovativo e pela reacção dos funcionários, não estariam habituados a semelhante pedido. Parece ser que tanto os funcionários do Centro de Emprego como os cidadãos que a ele se acercam vivem em paz e inocentes daquilo que é a missão de um sacerdote do sacrossanto Mercado, que é reduzir ao máximo as prestações sociais para que assim sejam libertadas todas as forças sagradas que salvarão o País e quem nele ainda viva.

Penso que mais rapidamente se resolvería a maleza que nos possuiu se simplesmente se fechasse os Centros de Emprego e que as estatísticas fossem fornecidas directamente pelas empresas que necessitassem de fiéis. Dessa forma, o mundo seria perfeito, pois não haveriam desempregados, simplesmente a oferta possível, que seria rapidamente satisfeita, como bem sabemos todos, pois afinal, quem necessita de trabalhar, tem sempre a preocupação de procurar e por isso sairia muito mais barato aos contribuintes que ainda conseguem pagar o desnecessário estado. Trata-se simplesmente de deixar o sacrossanto Mercado actuar. Bem aventurado Seja o Mercado!

Para um convertido como eu, fico sempre apreensivo quando oiço algum ímpio dizer, referindo-se aos sacerdotes da santa igreja do Mercado: "Pode ser que um dia se fodam!"

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